Os fatos que marcaram o vôlei brasileiro e mundial em 2018
Janaína Faustino
29/12/2018 06h00
A conquista do primeiro ouro da seleção sérvia no Mundial feminino foi um dos grandes acontecimentos de 2018 (Foto: Divulgação/FIVB)
Sérvia campeã mundial, Minas Tênis Clube de volta ao topo, França decepcionando mais uma vez, Sada Cruzeiro sucumbindo no cenário internacional, VakifBank colecionando troféus, seleção brasileira feminina vivendo o pior ano desde 2003, Trentino pentacampeão mundial de clubes…
Com o ano já no fim, é chegada a hora dos balanços e avaliações daquilo que deu certo e do que não funcionou no vôlei em 2018. Assim, o Saída de Rede realizou uma retrospectiva dos fatos que consideramos mais relevantes neste ano. Para alguns, 2018 provavelmente deixará saudades. Para outros, este certamente é um ano em que não há muitas razões para comemorar.
Confira o sobe e desce do vôlei neste ano em ordem alfabética:
SOBE
Equipes europeias
Liderada em quadra pela ótima levantadora Maja Ognjenovic, que voltou à sua seleção apenas para a disputa do Mundial, e pela jovem e excelente oposta Tijana Boskovic, que saiu como MVP da competição, a Sérvia se sagrou campeã mundial pela primeira vez neste ano. Terceiro colocado no Mundial de 2006, o time dos Bálcãs levou a medalha de prata na Olimpíada do Rio de Janeiro, em 2016, mas foi campeão do Europeu no ano passado. Além de Boskovic, a equipe ainda contou com atletas do nível da meio-de-rede Milena Rasic e da ponteira Brakica Mihajlovic para conquistar o título inédito.
Com uma seleção extremamente jovem, a Itália fez uma grande campanha no Mundial (Foto: Divulgação/FIVB)
Vice-campeã mundial, a tradicional Itália fez uma surpreendente competição, mostrando que poderá chegar aos jogos de Tóquio como uma das favoritas ao ouro. Com uma seleção repleta de jovens e promissores valores oriundos, em sua maioria, do Club Italia – projeto da Federação Italiana para produzir novos talentos –, a equipe de Paola Egonu, Miriam Sylla e Ofelia Malinov é mais um exemplo de que vale a pena investir na base e realizar um trabalho de longo prazo. Mesmo que este processo custe a ausência em pódios durante um bom tempo.
Mineiros
Com uma importância incontestável para a história do voleibol brasileiro, o Minas Tênis Clube teve um ano em que voltou definitivamente ao topo. Sob a liderança do italiano Stefano Lavarini, o time foi campeão sul-americano pela terceira vez ao bater o Sesc-RJ. Com o título, a equipe de Belo Horizonte conquistou o direito de disputar o Mundial de Clubes, conquistando novamente o vice-campeonato. Além disso, ao encerrar o ano em segundo lugar na classificação geral da Superliga, o Minas deixou evidente que tem plenas condições de ir ainda mais longe, ganhando o troféu da competição nacional.
Apesar de não ter se saído bem no Mundial de Clubes, o Dentil Praia Clube também tem o que festejar em 2018. Afinal, foi no primeiro semestre deste ano que a equipe de Uberlândia conquistou o troféu da Superliga pela primeira vez, quebrando a histórica hegemonia do Sesc-RJ. A fim de repetir a dose, o time manteve a mesma base, com jogadoras como Fernanda Garay, Nicole Fawcett e Fabiana, e se reforçou com nomes como a levantadora Carli Lloyd e a meio-de-rede Carol. Ainda em busca do entrosamento ideal, já assumiu a liderança do campeonato, com 23 pontos. Com esta campanha, o Praia mostra que tem potencial para brigar pelo segundo título consecutivo.
Seleção masculina
Contrariando a expectativa de muitos, seleção masculina chegou à quinta final consecutiva no Campeonato Mundial (Foto: Guilherme Cirino)
Em seu segundo ano no comando da seleção brasileira masculina de vôlei, o técnico Renan Dal Zotto passou por um teste de fogo. O Brasil começou a temporada patinando com uma campanha bastante sofrível na recém-criada Liga das Nações. Sob desconfiança por parte da torcida e da imprensa por ter terminado o torneio na quarta colocação com um desempenho repleto de altos e baixos, a equipe verde-amarela, que precisa urgentemente dar espaço a outros novos valores além daqueles já testados por Renan, chegou ao Mundial masculino, disputado na Itália e na Bulgária, sem o status de favorita.
Contudo, demonstrando força e incrível capacidade de superação, o time soube driblar dificuldades, como o inesperado revés para a seleção holandesa logo na primeira fase, e teve um desempenho fantástico quando foi exigido, como no caso da impressionante virada contra a Rússia na terceira etapa do torneio. Deste modo, a seleção brasileira fez história ao chegar, pela quinta vez consecutiva, a uma final de Mundial.
Assim, apesar do gosto amargo deixado pela medalha de prata, por ter sido batida pela Polônia na final por eloquentes 3 sets a 0, o saldo da seleção masculina é positivo. A possibilidade de convocação do brasileiro naturalizado Yoandy Leal, que estará à disposição a partir de abril, tem animado ainda mais os torcedores. No entanto, é preciso salientar que o ponteiro, sozinho, não será a solução dos problemas do Brasil. O próximo ano será uma ótima oportunidade para Renan fazer mais testes, pois não teremos grandes torneios. É óbvio que há muito o que fazer neste ciclo se a equipe quiser continuar no pódio na Olimpíada de Tóquio, em 2020. Mas, mesmo com muita dificuldade, o Brasil se manteve entre os melhores do mundo e tem o que comemorar neste final de ano.
Seleção polonesa
Em dívida com seus apaixonados torcedores desde a conquista do Mundial de 2014, equipe polonesa teve uma atuação de gala na final, faturando o tri (o segundo consecutivo) (Foto: Divulgação/FIVB)
Até o Campeonato Mundial, era bastante inusitada a situação da seleção polonesa. É que após a conquista da primeira medalha de ouro no Mundial em casa, em 2014, a Polônia pouco mostrou de consistente no cenário internacional. Na Olimpíada do Rio a equipe alcançou o quinto lugar; já no Campeonato Europeu do ano passado, os poloneses terminaram na décima colocação e na Liga das Nações os europeus chegaram novamente em quinto.
Com a contratação do belga Vital Heynen, no entanto, os apaixonados fãs poloneses puderam ver sua seleção se tornar tricampeã mundial, vencendo novamente (e de forma categórica) a equipe brasileira. Para tanto, o treinador apostou em uma mescla de jovens promissores, como o ponteiro Artur Szalpuk, com jogadores mais experientes, como o talentoso passador Michal Kubiak e o oposto Bartosz Kurek, que levou o prêmio de MVP da competição. Investindo muito na base, a Polônia parece decidida a se manter entre as grandes seleções do mundo e promete chegar forte nos jogos de Tóquio.
Trentino
Apesar de não ter chegado ao Mundial de Clubes como favorito, Trentino cresceu na competição e levou o penta (Foto: Divulgação/FIVB)
Um dos mais tradicionais times de voleibol do mundo, o italiano Trentino não chegou ao Mundial de Clubes na condição de candidato ao título. Mas, contando com jogadores de peso para esta temporada, como o extraordinário líbero Jenia Grebennikov, os excelentes ponteiros Aaron Russell e Uros Kovacevic e o ótimo central Srecko Lisinac, a equipe de Trento virou o jogo e, fazendo jus à sua imensa tradição na competição, ganhou o pentacampeonato ao derrotar o badalado Lube Civitanova, de Leal, Bruninho, Simon e Juantorena, por 3 sets a 1.
Com isso, a equipe de Angelo Lorenzetti se tornou o maior vencedor de toda a história do torneio, mantendo a incrível marca de nunca ter perdido uma final. Em segundo lugar na tabela do Campeonato Italiano, o time também fecha muito bem o ano de 2018.
VakifBank
A mais temida equipe do voleibol mundial feminino na atualidade, se tornou quase "chover no molhado" falar sobre o poderoso VakifBank, da Turquia. Com uma imensa coleção de troféus que conta, entre outros, com 10 títulos da liga turca e 4 taças da Champions League, a mais prestigiosa competição de clubes da Europa, o grupo comandado pelo polêmico italiano Giovanni Guidetti fechou o ano com mais uma grande conquista: o Mundial de Clubes, pela terceira vez (a segunda consecutiva), ao vencer o brasileiro Minas Tênis Clube por 3 sets a 0 na final.
Uma máquina de produzir títulos, o time de Istambul tem em seu plantel algumas das melhores jogadoras do mundo em suas respectivas posições, entre elas, a espetacular ponteira chinesa Ting Zhu, a central sérvia Milena Rasic e a oposta holandesa Lonneke Slöetjes. Além disso, fazem parte do elenco as promissoras turcas Cansu Ozbay (levantadora), Ebrar Karakurt (oposta) e Zehra Gunes (meio-de-rede).
DESCE
Giba
Novo integrante do Hall da Fama do vôlei mundial, Giba teve um começo de ano difícil (Foto: Divulgação/FIVB)
Logo no início do ano, uma notícia surpreendeu os fãs do vôlei e do ex-ponteiro da seleção brasileira integrante do Hall da Fama como um dos maiores jogadores da história: a justiça decretou prisão de 60 dias para Giba pelo não pagamento de pensão dos seus filhos com a também ex-jogadora Cristina Pirv. A ordem, entretanto, não chegou a ser executada uma vez que, antes da expedição do mandado, seu advogado conseguiu uma liminar que suspendeu a decisão até a realização da audiência entre as partes envolvidas.
Giba se defendeu com uma nota oficial em suas redes sociais, alegando não ter recursos para pagar os valores estabelecidos pela Justiça. Sua ex-mulher também se pronunciou, negando os argumentos expostos pelo ex-jogador, em uma queda de braço que gerou muita polêmica e arranhou a imagem de um dos maiores astros da modalidade no mundo. Após o imbróglio, o atleta pagou o que devia e Cristina Pirv se mudou para a Europa com os filhos.
Polêmicas da seleção masculina fora de quadra
Se dentro da quadra a seleção masculina conseguiu se destacar neste ano com o vice-campeonato mundial, fora das quatro linhas o grupo viveu algumas situações polêmicas. A primeira delas foi logo após as vitórias contra o Egito, na estreia do Mundial, e contra a França na segunda rodada da competição: em duas imagens publicadas no Instagram da Confederação Brasileira de Vôlei (CBV) e no site da Federação Internacional de Vôlei (FIVB), os jogadores Wallace e Maurício Souza apareceram fazendo sinais com as mãos que formavam o número do então candidato à presidência Jair Bolsonaro (PSL).
Nas redes sociais, as imagens causaram uma grande celeuma e os fãs do vôlei se dividiram entre os que defendiam o direito de manifestação política dos atletas e aqueles que acreditavam que na seleção não deveria existir espaço para isso. A CBV divulgou nota oficial afirmando que "não compactua com manifestações políticas" e que a "gestão da seleção [iria] tomar providências para não permitir que aconteçam manifestações coletivas".
Além disso, durante a disputa do Mundial, a FIVB suspendeu o técnico Renan Dal Zotto por aquilo que considerou "conduta inapropriada" na partida histórica do Brasil contra a Rússia na terceira fase. O lance que levou à punição do treinador aconteceu quando o Brasil vencia os europeus por 14 a 11 no tie-break. Enquanto o time russo detinha a posse de bola e construía o ataque, uma bola apareceu subitamente no lado verde-amarelo. A entidade alegou que Renan jogou a bola propositalmente na quadra para atrapalhar o ataque adversário. Com a suspensão, o treinador não pôde estar no banco de reservas na partida em que a seleção já entrou classificada contra os EUA.
Sada Cruzeiro e Zenit Kazan no Mundial
Dois times que dominaram o Mundial de Clubes nos últimos anos, o brasileiro Sada Cruzeiro e o russo Zenit Kazan tiveram quedas estrondosas na última edição do torneio, saindo da disputa ainda na primeira fase ao somarem duas derrotas cada um. A equipe brasileira, que passa por um processo de reformulação com a incorporação de novas peças, sofreu uma desclassificação histórica, já que foi a primeira vez que a Raposa não conseguiu passar da primeira fase. Os brasileiros caíram diante do Asseco Resovia, modesto time polonês que vinha fazendo uma pífia campanha na competição local, e do Trentino, tradicional clube italiano que cresceu no torneio e acabou levando o troféu.
O Zenit, por outro lado, assim como o Cruzeiro, também sofreu uma baixa fundamental na temporada com a saída de Wilfredo León, talvez a sua maior estrela, para o Perugia, atual líder do Campeonato Italiano. Foram dois revezes do time na primeira fase do Mundial: para o também russo Fakel Urengoy e o italiano Lube Civitanova. Como se não bastasse o fiasco pela queda, inconformados com a derrota para o time de Bruninho e Leal, o técnico Vladimir Alekno, o ponteiro Ngapeth e o líbero Alexei Verbov ainda criaram confusão em quadra, culpando o árbitro brasileiro Rogério Espicalsky pela desclassificação.
Seleção feminina
Seleção feminina viveu o seu pior ano desde 2003, quando o técnico José Roberto assumiu o cargo. Com isso, 2019 promete ser um ano decisivo para as pretensões da equipe nos jogos de Tóquio (Foto: Divulgação/FIVB)
O pior ano desde 2003, quando o técnico José Roberto Guimarães assumiu a equipe. Este é o saldo da seleção feminina de vôlei em 2018. A queda desastrosa na segunda fase do Campeonato Mundial representou o ápice negativo de uma temporada onde nada deu certo. Além da eliminação prematura na mais importante competição do ano, em que terminou na sétima colocação, a equipe alcançou apenas o quarto lugar tanto na Liga das Nações quanto no Montreux.
Estes resultados aliados a um desempenho bastante aquém do esperado expuseram as enormes dificuldades que o vôlei nacional enfrenta para se renovar e lançar jovens valores. Vivendo uma grave crise na base, a seleção passa por um período de transição motivado pela saída/aposentadoria de jogadoras importantes, mas não consegue repor as peças com a mesma qualidade de outros tempos.
Prova disso é que o time vem sobrecarregando Tandara justamente por não ter uma oposta reserva à sua altura. Além disso, nesta temporada, a comissão técnica apostou em atletas (algumas já veteranas) que chegaram ao Mundial aos trancos e barrancos, ainda se recuperando de lesões e/ou vindo de um longo período sem atuar. Vale ressaltar, ainda, que não houve qualquer clamor por parte da torcida por algum nome que tenha ficado de fora na convocação.
Assim, enquanto vemos o crescimento de jovens seleções como a da Itália e da Turquia, que têm investido pesado nas categorias de base, a seleção brasileira segue patinando e apostando nas mesmas peças. Em suma, se Renan Dal Zotto terá um árduo trabalho pela frente em 2019, o de José Roberto Guimarães não deverá ser menor se quiser colocar o time de volta à rota de medalhas às quais nos acostumamos.
Seleção francesa
De todas as seleções do primeiro escalão, a francesa é vista como a que joga o voleibol mais bonito e técnico da atualidade. Fortíssima candidata a ganhar o título em qualquer torneio que dispute, a França tem, sem dúvida, a geração mais prodigiosa de sua história. No entanto, os 'bleus' não conseguem converter tanto talento em conquistas e, com isso, colecionam fracassos. Com nomes estrelados de capacidade incontestável, como o ponta Earvin Ngapeth, o meio-de-rede Kévin Le Roux, o líbero Jenia Grebennikov e o promissor oposto Stephen Boyer, entre outros, a equipe europeia decepcionou novamente em 2018.
O time de Laurent Tillie venceu a extinta Liga Mundial em 2015 e 2017. Contudo, neste intervalo, amargou a nona colocação na Olimpíada do Rio de Janeiro, em 2016, pois sequer conseguiu passar da primeira fase, e fracassou no Campeonato Europeu do ano passado ao ser eliminado nas oitavas-de-final. Além disso, perdeu, em casa, a final da Liga das Nações para a Rússia neste ano.
Como se não bastasse, mais um fiasco: foi eliminada do Mundial masculino na segunda fase, terminando a mais importante competição do ano em sétimo lugar. Vários aspectos são apontados como motivos para tantas quedas, mas os problemas físicos parecem fazer toda a diferença. Esperemos que a França sofra menos com as lesões e possa finalmente desencantar no ano que vem.
Concorda? Discorda? Se lembra de mais algum destaque positivo ou negativo do vôlei no ano que está acabando? Deixe seu recado na caixa de comentários!
Sobre a autora
Carolina Canossa - Jornalista com experiência de dez anos na cobertura de esportes olímpicos, com destaque para o vôlei, incluindo torneios internacionais masculinos e femininos.
Sobre o blog
O Saída de Rede é um blog que apresenta reportagens e análises sobre o que acontece no vôlei, além de lembrar momentos históricos da modalidade. Nosso objetivo é debater o vôlei de maneira séria e qualificada, tendo em vista não só chamar a atenção dos fãs da modalidade, mas também de pessoas que não costumam acompanhar as partidas regularmente.