Marcelo Fronckowiak: novos tempos, novas possibilidades
O Saída de Rede abre espaço para a opinião de um dos profissionais mais respeitados do voleibol brasileiro, reconhecido internacionalmente: Marcelo Fronckowiak*, assistente técnico da seleção masculina. Estudioso da modalidade, ele é um dos entusiastas da escola brasileira de voleibol, estilo moldado a partir da mescla do modelo asiático com o europeu e que ganhou contornos próprios nos anos 1980, quando começou a dar frutos. Fronckowiak vê, no momento, uma janela de oportunidade para a expansão do vôlei pelo país, em mais uma onda, além daquelas vivenciadas com o boom dos anos 1980 e a febre do início dos anos 1990.
"Precisamos deixar a zona de conforto, sair da bolha e encarar o voleibol como possibilidade de negócio", afirma Marcelo Fronckowiak.
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Confira o artigo do treinador:
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Atualmente auxiliar da seleção brasileira e fora da Superliga, tenho nesta temporada uma rotina de tempo muito diferente de anos anteriores.
No lugar das análises de vídeo e de estatísticas, dos treinamentos, das viagens e da pressão por resultados, me vi com tempo. Tempo para continuar a estudar, para assistir jogos na TV e ao vivo, para conferir os resultados internacionais, para pensar em um novo projeto e, sobretudo, para olhar o voleibol de um ângulo diferente. Até mesmo a possibilidade de voltar a bater uma bolinha tem acontecido.
Nestas andanças, pude recuperar o contato com amigos de longa data e que também militam na modalidade. Em conversas com estes amigos, professores, técnicos e amantes do voleibol, pude constatar um fato bastante relevante: vivemos uma nova onda de prática e de interesse pelo nosso esporte.
Retomada
A popularidade da modalidade retoma períodos muito importantes e promissores que foram cruciais no sucesso da escola brasileira de voleibol nos anos 1980, 1990 e 2000.
Obviamente estou falando da realidade que tenho visto no Rio Grande do Sul, mas que, segundo contatos, se espalha por todo o Brasil.
Isto me faz pensar no início deste amor do brasileiro pelo voleibol: os anos 1980.
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Naquela década a seleção brasileira masculina finalmente chegou ao pódio das principais competições mundiais. O voleibol de clube se difundiu por vários estados e fez aparecer uma nova geração de praticantes que deram sequência à geração de prata. No feminino, reconquistaríamos a hegemonia sul-americana mais tarde e fidelizaríamos o torcedor a partir da geração juvenil de 1987, primeiras campeãs mundiais vestindo a camisa brasileira.
Mesmo com a dificuldade de sequência de resultados, o voleibol dos anos 1980 caiu no gosto popular. Nunca mais deixamos de amar este esporte e a modalidade passou a ser considerada a segunda força do país. O parque Ibirapuera, as areias de Copacabana, as praças e parques Brasil afora eram lotadas de praticantes.
Repatriamento
Nos anos 1990, com o primeiro ouro olímpico, a febre voltou. Por meio da iniciativa do Banco do Brasil e da Confederação Brasileira de Vôlei (CBV) no repatriamento dos campeões olímpicos de 1992, o campeonato nacional se tornou respeitado em nível mundial, atraindo excelentes atletas estrangeiros e investimento de empresas de porte. Dominamos o cenário das competições internacionais na base e formamos uma nova geração que continua ainda na ativa. O profissionalismo enfim chegou! Outra vez tivemos um hiato nos resultados das categorias adultas, mas, nem por isto, o brasileiro deixou de lado o voleibol.
Nos anos 2000, cartão pleno. Ouros olímpicos nas quadras e nas areias, Campeonatos Mundiais, Grand Prix, Ligas Mundiais – homens e mulheres no topo.
Apesar de ser esta a década mais vitoriosa da história da escola brasileira de voleibol, a prática dentro e fora dos clubes, em praças e parques públicos, não correspondeu às ondas anteriores.
Os motivos para esta diminuição da prática são os mais diversos e poderíamos citar a entrada de novas oportunidades de lazer para os jovens (inclusive a internet e as redes sociais). De qualquer forma, mesmo campeões, passamos a jogar menos, a praticar menos e a formar menos atletas responsáveis pela renovação.
Desafio
E o que faremos com esta nova onda que agora se anuncia pós-Rio 2016, com esta vontade das pessoas em praticar, brincar e em serem protagonistas do jogo? O que pensamos nós, os atores da modalidade, o que pretendemos fazer para não perdermos esta nova chance de popularização, de prática em massa e consequente midiatização do voleibol?
Há vários anos defendo que tenhamos a humildade necessária para nos espelharmos em modelos que dão certo pelo mundo. Não se trata de cópia pura e simples, mas de inspiração e estudo em fórmulas que façam com que a nossa modalidade seja ainda mais atrativa. E rentável!
Nos EUA ainda não existe profissionalismo. Porém, as ligas universitárias, principalmente as femininas, são consideradas como negócio, gerando valor através das televisões, das transmissões via web, das bilheterias e das iniciativas de licenciamento de produtos.
Na Europa, vários campeonatos profissionais obtêm lucro, os times são franquias e, especificamente no campeonato Italiano, um jogador pode ser vendido a outro clube, dando lucro aos investidores. Transações entre países acontecem com frequência e jogadores são negociados seguindo o exemplo de outros esportes.
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Empenho
Algo que me incomoda demasiadamente na nossa forma de enfrentar os problemas é a crítica pela crítica e a ausência de propostas, sobretudo, a ausência da entrega pessoal e coletiva para mudarmos o quadro.
O que podemos fazer a mais? O que podemos fazer melhor? Qual o planejamento de marketing das equipes e dos campeonatos para que possamos enfim obter lucro nas bilheterias, nas transmissões, no licenciamento de produtos e nos eventos durante nossos campeonatos?
Temos muitos problemas, é fato. Mas temos muitas oportunidades.
O boom das universidades associadas ao voleibol nos anos 1990/2000 foi uma oportunidade de ouro que se perdeu. Nosso modelo atual é excludente na relação esporte e estudo: ou se torna profissional ou estuda.
Além disso, uma equipe de rendimento de alto nível que seja associada a uma universidade pode representar uma fonte enorme de estudos e iniciativas acadêmicas. Além dos novos alunos atraídos pela prática do esporte no meio universitário, pesquisas com os atletas e estágios profissionalizantes junto à equipe representam um diferencial de peso perante a concorrência: alunos de educação física, de fisioterapia, de marketing e de diversas outras graduações podem ter acesso a um laboratório vivo para experiências e vivências profissionais.
Exemplo
Na equipe do Canoas Vôlei, que dirigi no ano passado e que era ligada a uma universidade, treze dos dezesseis atletas e eu éramos universitários. O preparador físico Guilherme Berriel, que fez a coleta de dados dos treinamentos, irá utilizá-los para produzir artigos científicos de relevância internacional. Infelizmente, esta iniciativa não foi aproveitada pela instituição em questão e estes estudos serão publicados pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Só para constar, quando do início das equipes competitivas na Universidade Luterana do Brasil (Ulbra), nos anos 1990, o curso de educação física pulou de 300 alunos matriculados para 3.000. Hoje, a possibilidade de associarmos o voleibol aos times de futebol começa a se apresentar… Nova onda, novos tempos. Mais oportunidades. Precisamos deixar a zona de conforto, sair da bolha e encarar o voleibol como possibilidade de negócio. E precisamos incluir esta massa de público que neste momento está muito interessada em praticar e curtir o voleibol.
Nós, os atores do esporte, precisamos e devemos fazer mais. De simples clínicas e visitas às escolas a ações de apadrinhamento de instituições, criação de escolinhas. Da participação em ações de patrocinadores e de prefeituras à criação de canais no YouTube para mostrar treinos e jogos. Precisamos ainda de planejamento para transformar os jogos em eventos.
Quando teremos outra chance, outra janela de oportunidade? Ou será que estamos esperando o sucesso de alguma outra modalidade esportiva no Brasil para, enfim, nos movimentarmos?
*Marcelo Fronckowiak é assistente técnico da seleção brasileira masculina de vôlei. Tem três títulos da Superliga como jogador e dois como treinador. Trabalhou como técnico na França e na Rússia.
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