Manobra de dirigente mostra o quanto o vôlei ainda é vulnerável
O voleibol tem se mostrado um terreno fértil para as mais variadas alterações, de acordo com a conveniência e os interesses dos seus mandatários. Que o diga a mudança no sistema classificatório para os Jogos Olímpicos, com a criação de novos qualificatórios, tudo para manter no Japão a realização da Copa do Mundo, fonte de receita para a Federação Internacional de Vôlei (FIVB). A mais recente ocorreu neste fim de semana, em um torneio masculino em Colorado Springs, nos Estados Unidos, pelas mãos do presidente da Confederação da América do Norte, Central e do Caribe (Norceca), o dominicano Cristóbal Marte, que comanda aquela entidade desde 2001 e atualmente é também o primeiro vice-presidente da FIVB e vice-presidente executivo da federação do seu país.
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No caso de Marte, um tipo que parece saído de uma ópera-bufa, a vantagem foi beneficiar seu próprio país, abrindo caminho para uma inédita medalha no campeonato da Norceca e a volta ao Mundial masculino. Numa mudança de última hora, ele alterou as semifinais. A competição terminou neste domingo (1º), com ouro para os EUA, prata para a República Dominicana e bronze para o Canadá. O México ficou na quarta colocação. Os três primeiros países garantiram lugar no Mundial 2018. Outras duas vagas serão disputadas até o final deste ano, em data e local a serem definidos, num qualificatório com a presença do México, da Guatemala e ainda de Cuba e de Porto Rico – estas duas seleções não conseguiram embarcar para Colorado Springs em razão dos estragos causados pelo furacão Irma nos aeroportos em seus países.
Virada de mesa
Até às 13h de sábado (horário local), data das semifinais, os canadenses jogariam contra os dominicanos enquanto os americanos enfrentariam os mexicanos – com a primeira partida marcada para 17h. Veio então a virada de mesa. Marte, fiel escudeiro do brasileiro Ary Graça, presidente da FIVB, determinou que a República Dominicana iria jogar contra o México na primeira semifinal, com EUA e Canadá na partida de fundo, uma óbvia final antecipada.
O problema é que as equipes vinham, desde a noite anterior, estudando outro adversário. Na primeira semifinal, o México, que está longe de ser uma seleção forte, mas que em condições normais de temperatura e pressão é claramente superior à República Dominicana, caiu em sets diretos. O Saída de Rede assistiu o jogo e o time dominicano pareceu bem adaptado à situação. Na sequência, em uma partida de baixo nível técnico, os EUA venceram o Canadá também por 3-0.
Falta de postura
Com a vitória sobre os mexicanos, a fraca seleção dominicana garantiu não apenas uma medalha inédita, mas ainda seu retorno ao Campeonato Mundial – sua única participação havia sido em 1974, terminando em 22º lugar entre 24 países. A ausência de cubanos e porto-riquenhos foi providencial. Festa em quadra, com a presença do presidente da Norceca, que mandou o protocolo e a postura às favas e foi festejar – já no cargo, havia rolado no chão com as jogadoras da República Dominicana comemorando o ouro nos Jogos Pan-Americanos 2003. Será que ele já ouviu falar em conflito de interesses?
No domingo, o Canadá venceu o México por 3-1 para ficar com o bronze e a vaga para o Mundial, depois os EUA passearam contra os dominicanos – uma das parciais foi fechada em 25-10. Alguém reclamou sobre a mudança nas semifinais? Oficialmente, não. A gritaria fica restrita aos bastidores. "Você não pode reclamar, isso só o irrita mais. Marte faz o que quer e ninguém o contraria", disse ao SdR uma fonte da Volleyball Canada, organização que administra a modalidade naquele país. "Ele é autoritário, não tem limites", endossa outra, da USA Volleyball. As duas fontes pedem anonimato por motivos óbvios. A da Volleyball Canada contou ainda que os mexicanos ficaram possessos, afinal só souberam que iriam enfrentar a República Dominicana, equipe que estão acostumados a derrotar, apenas quatro horas antes do confronto na semifinal, comprometendo as chances de classificação para o Mundial 2018.
Animador de torcida
Marte é figurinha carimbada no mundo do voleibol. Na Rio 2016, designado pela FIVB como diretor técnico dos dois torneios indoor, era visto passeando pelo Maracanãzinho. Um mês antes, em Santo Domingo, capital do seu país, na decisão da desimportante Copa Pan-Americana feminina, competição criada e mantida pela Norceca, o dirigente constrangia público e atletas ao pegar o microfone e fazer ele mesmo as vezes de locutor e animador de torcida na entrega dos prêmios individuais – "ela é a melhor do mundo", berrava, antes de entregar o prêmio de melhor líbero para a dominicana Brenda Castillo.
Durante o Grand Prix 2017, três jogadoras da seleção feminina, Brenda Castillo, Marian Fersola e Niverka Marte, tiveram problemas com seus passaportes e foram temporariamente impedidas de entrar na Rússia. O impasse foi resolvido, mas depois Cristóbal Marte saiu-se com essa pérola: "As jogadoras deveriam ter passaporte diplomático, pois são embaixadoras do nosso país". Então tá.
Entre desmandos, gafes e deslumbramento, Marte, 65 anos, segue firme como um dos principais dirigentes do voleibol mundial. Nos eventos com a presença do brasileiro Ary Graça, outra figura controversa, o dominicano é a sua sombra. Pobre voleibol!
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