Levantador e técnico ao mesmo tempo, brasileiro brilha no vôlei na Noruega
Biatlo, esqui cross-country, hóquei no gelo, snowboarding. Certamente você vai encontrar algumas destas modalidades se pesquisar sobre os esportes mais populares da Noruega. Não por acaso, o frio e pequeno país europeu é uma verdadeira potência nos Jogos Olímpicos de Inverno e lidera o ranking mundial no número de medalhas conquistadas na história da competição.
Neste cenário, o vôlei acaba obtendo pouco espaço por lá. Esta história, contudo, vem mudando aos poucos, contando com a colaboração de um brasileiro. Aos 30 anos, o levantador carioca Vitor Macedo tem contribuído para despertar a atenção dos nórdicos para a modalidade e o campeonato local. E, curiosamente, ele vem brilhando de duas formas: como levantador do Førde Volleyballklubb e, ao mesmo tempo, como treinador da equipe feminina do clube.
Entretanto, antes de se destacar na Noruega, a trajetória do armador começou em sua cidade natal, mais precisamente, no Botafogo. Foi lá que Vitor iniciou a carreira e se apaixonou pelo vôlei.
"Fiz teste para o Botafogo em 2004 e passei. Comecei no infantil e joguei até o adulto, ficando lá por 6 anos. Joguei praticamente todos esses anos como ponteiro e líbero até que um dia o nosso levantador titular se machucou e eu entrei para substituí-lo. Foi naquele dia que virei levantador e sou até hoje", explica ele. "Eu nunca me destaquei no Botafogo, mas a minha geração era diferenciada, com atletas talentosos, como o ponteiro Rogério Mineiro [atualmente no Vôlei Itapetininga], que até hoje é um dos meus melhores amigos. Fomos campeões estaduais no infanto, juvenil e adulto", relembra.
Leia mais:
– Seleção feminina joga Pré-Olímpico em casa; masculina vai para a Bulgária
– Técnico do time feminino do Minas assume seleção sul-coreana
Depois do Botafogo, Vitor Macedo teve uma breve passagem pelo semiprofissional da Noruega e pela liga universitária canadense, em que se formou em Cinesiologia (equivalente ao curso de Educação Física) pelo Camosun College, em Vancouver Island. Na temporada 2016/2017 o jogador se transferiu para o Førde, clube que carrega o nome da pequena cidade que fica a cerca de 320 km da capital Oslo.
Logo que chegou, ele se sagrou campeão da Mizunoliga – a Liga Norueguesa –, levando o prêmio de MVP das finais. Com o sucesso em sua estreia no profissional, renovou o contrato para a temporada seguinte para permanecer como levantador do time e, ainda, assinou com o clube para começar a atuar em uma nova função: a de técnico da equipe feminina. Um trabalho e tanto que já vem rendendo frutos.
Como treinador, o levantador conquistou a Copa Norueguesa e o campeonato local na temporada 2017/2018. "Foi um desafio muito grande, porque o time feminino em Førde nunca tinha chegado a uma final na sua história. Elas ficaram no "quase" por muitos anos. Então nessa temporada nós surpreendemos e ganhamos o "Double", que é a Copa e a Mizunoliga. No masculino, fomos vice-campeões nacionais", conta, orgulhoso. Além disso, Vitor levou a equipe feminina à disputa da Copa CEV neste ano, o segundo torneio mais importante de clubes na Europa.
Ele diz que a rotina de trabalho como levantador e técnico não é fácil, mas o conhecimento e a experiência que tem adquirido compensam todas dificuldades. "Foi um ano de muito aprendizado para todos nós. Quase todo fim de semana o feminino e o masculino jogam no mesmo dia. Então, tenho dois treinos de saque e passe pela manhã, corro para o restaurante com o time, almoço e já preciso seguir para o ginásio de novo com as atletas. E, quando acaba o feminino, o masculino já está aquecendo", detalha.
"Então foi bem difícil para eu me adaptar. Além disso, somos apenas eu e um assistente técnico no time. Sou eu que planejo todos os treinos com bola, faço as estatísticas no Data Volley [programa que fornece o scout e auxilia na análise das partidas], edito vídeo e atuo como preparador físico delas. Eu tenho que fazer praticamente tudo porque o clube não tem condições de bancar uma comissão técnica maior. Mas isso é ótimo porque estou aprendendo de tudo um pouco, e faço todas as coisas do meu jeito. Estou gostando muito dessa oportunidade de ser técnico-atleta", complementa.
Em termos de nível técnico e organização, Vitor coloca que a Mizunoliga vem crescendo a cada ano, impulsionada principalmente pela visibilidade de Anders Mol e Christian Sorum, dupla norueguesa de vôlei de praia campeã mundial em 2018. No entanto, as condições são rudimentares e ainda há muito o que fazer.
"Isso [o sucesso de Anders e Christian] deu mais visibilidade ao vôlei de quadra e a procura está sendo maior. A Noruega é um país muito pequeno, e o orçamento dos times é muito baixo. São poucos os jogadores que ganham bem. A maioria joga por amor ao esporte mesmo. Então, é um grande misto de jogadores bons, com experiência internacional, com outros mais novos que estão entrando no mercado. A organização não é das melhores e a Federação ainda tem testado muitos formatos, tentando achar o ideal. Isso prejudica muito o planejamento das equipes", relata.
Vale lembrar que a Noruega é vizinha da Finlândia, país que possui uma seleção masculina de nível técnico razoável que vez ou outra costuma dar algum trabalho às grandes equipes em competições oficiais. Sobre a diferença entre ambos, Vitor explica que não há qualquer concorrência ou hostilidade. "Os noruegueses são bem tranquilos em relação aos países vizinhos. A liga da Finlândia está cada vez mais forte e tem trazido jogadores internacionais para os times de lá, o que deve estar ajudando a seleção. Não existe uma rivalidade. (…)", sublinha.
Além disso, o técnico-atleta conta que o Brasil é visto com admiração pelos noruegueses. "Todos são muito apaixonados por voleibol, principalmente o brasileiro. Quando eu digo que sou amigo de alguns jogadores renomados, campeões olímpicos, eles nem acreditam. As pessoas assistem aos jogos da Superliga frequentemente e estão sempre me perguntando coisas sobre o vôlei de quadra e praia no Brasil", comenta, entusiasmado.
Vitor coloca que seria um sonho atuar na Superliga, mas ressalta que a idade e o fato de estar há dez anos fora – o que o tornou pouco conhecido no país – podem ser empecilhos para um retorno. "É difícil contratar um levantador que você nunca ouviu falar. Não me destaquei nas categorias de base no Brasil, mas cresci muito tecnicamente de lá para cá", afirma. "Em 2015, fui campeão da liga universitária no Canadá. O mesmo aconteceu na Noruega, sem contar os prêmios individuais que ganhei. Também tive a oportunidade de jogar campeonatos como a Challenge Cup, e a CEV contra times de altíssimo nível. Então, eu sou muito mais reconhecido fora", aponta.
Para ele, contudo, o crescimento por que tem passado faz toda a diferença no final. "Como qualquer outro jogador de vôlei que não atua no Brasil, tenho vontade de voltar a jogar aí. Se um eu dia tiver essa oportunidade, será difícil dizer não, mas estou muito feliz e adaptado à rotina daqui. Estou em constante evolução profissional e pessoal, e é isso o que importa", avisa.
Segundo o atleta, é possível ser bem-sucedido em campeonatos pouco conhecidos. Contudo, equilíbrio e comprometimento são fundamentais. "Existe a possibilidade de um futuro bacana, mesmo para quem não atua nas grandes ligas. Os brasileiros profissionais do vôlei, técnicos ou atletas, são bastante admirados, respeitados e reconhecidos no mundo inteiro. Com certeza, sair do Brasil é um desafio e tanto porque tem o clima, a cultura e outros aspectos que são bem diferentes de outros países. Mas, se correr atrás e tiver disposição para passar por essas mudanças, aos poucos você vai se adaptando e conquistando o seu espaço. Paciência e persistência são as palavras-chave nesse processo", conclui.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.