Topo

Saída de Rede

Ética no vôlei: nova vítima suscita uma velha questão

Sidrônio Henrique

01/10/2016 06h00

A seleção da Macedônia fez sua parte, mas acabou prejudicada por um resultado alheio (foto: CEV)

A Macedônia chegou perto da repescagem para o Campeonato Europeu Masculino 2017, que será realizado no final de agosto e início de setembro na Polônia. Os macedônios fizeram sua parte ao vencerem a Romênia por 3-1 na última rodada do grupo F das eliminatórias, disputadas em dois quadrangulares. Mas na partida de fundo, já classificada para o Europeu, a então invicta República Tcheca colocou apenas reservas em quadra e perdeu em sets diretos para a Estônia. Resultado: os estonianos terão mais uma chance e vão para a repescagem, decidindo a vaga no torneio continental em dois confrontos, de ida e volta, contra a Letônia, que vem da chave D. À Macedônia restou reclamar. E foi o que fez, mas sem ter eco.

Curta o Saída de Rede no Facebook
O que leva uma campeã olímpica à 2ª divisão da China? Fê Garay explica

A seleção tcheca havia ganhado seus cinco jogos anteriores com relativa facilidade – no duelo contra a Estônia no primeiro quadrangular não permitiu que o adversário ultrapassasse os 20 pontos no set mais disputado. A atitude da comissão técnica da República Tcheca suscita a velha discussão sobre ética no esporte, algo que volta e meia ocorre no voleibol, quando times colocam reservas em quadra para partidas que pouco ou nada lhe importam, mas que afetam terceiros, ou até jogam para perder, de olho em situação vantajosa mais adiante.

O oposto Théo Lopes foi levantador na infame derrota contra a Bulgária no Mundial 2010 (foto: FIVB)

Mundial 2010
A polêmica já envolveu diversas seleções, inclusive o Brasil. No Mundial 2010, com ambos já classificados, a seleção brasileira perdeu de propósito para a Bulgária na segunda fase para pegar adversários mais fáceis na terceira. Não que os búlgaros tivessem entrado em quadra com disposição para vencer, como admitiu mais tarde o oposto Tsvetan Sokolov, na época reserva, mas os brasileiros se arrastavam. Cinco anos depois, ao lançar sua biografia, o ponteiro Giba confirmou a marmelada. "Vamos parar de demagogia, se entregou ou não. Todo mundo viu. Mas briguem com o regulamento, não briguem com a gente", disse o ex-craque, em 2015, no lançamento do livro Giba Neles, no qual aborda o episódio.

O regulamento havia sido feito claramente para beneficiar o país-sede, no caso a Itália, que terminou em quarto lugar. Além do Brasil, outras seleções entregaram algumas partidas, mas a equipe comandada por Bernardinho, que acabaria conquistando seu terceiro título mundial consecutivo, foi a mais visada, até pelo status do time no cenário internacional.

EUA vs. França na Liga Mundial 2015: jogo de compadres impediu o Brasil de avançar à semifinal da competição (foto: FIVB)

Liga Mundial 2015
A fórmula torta acabou sendo sepultada pela Federação Internacional de Vôlei (FIVB). Entretanto, o formato de outros torneios não impediu que a pantomima continuasse. Na Liga Mundial 2015 o Brasil foi vítima, mas sem choro. Depois de perder para a França na estreia da fase final e de vencer os Estados Unidos, ambos por 3-1, no Maracanãzinho, no Rio de Janeiro, a seleção brasileira viu americanos e franceses encaixarem o único resultado que interessava a ambos, com saldo de pontos que desclassificava o Brasil – o jogo terminou 3-1 para os EUA, com direito a erros bisonhos da França no quarto set.

Pré-Olímpico 2012
No vôlei feminino houve polêmica no Pré-Olímpico Mundial 2012. Antes da última partida do torneio, entre Sérvia e Japão, três equipes estavam na expectativa pelas duas últimas vagas para os Jogos de Londres. Além das duas acima, a Tailândia também ficou de olho no placar. O jogo teve cara de armação, terminando em um 3-2 a favor das sérvias sobre as japonesas, único resultado que classificava ambas, para azar das tailandesas, que reclamaram em vão.

Macedonian VF

Carta
Numa carta (clique na imagem ao lado para ampliá-la) ao polonês Wojciech Czayka, presidente da Comissão Organizadora Esportiva Europeia (ESOC), integrante da Confederação Europeia de Vôlei (CEV), o presidente da Federação Macedônia de Vôlei, Petar Jovanovski, ressaltou que a seleção do seu país que competia naquele qualificatório representava mais de 10 anos de investimento. "Pedimos que vocês façam algo em relação a essa quebra das regras, de forma que não volte a acontecer e afete a imagem do voleibol como um esporte limpo", afirmou Jovanovski na carta também assinada pelo secretário-geral da Federação, Zoran Karanovic. A CEV não se manifestou até agora.

VENEZUELA RECLAMA APÓS EXCLUSÃO DO GP
A Federação Venezuelana de Voleibol (FVV) estava certa de que sua seleção feminina finalmente estrearia no Grand Prix no ano que vem. O time conquistou um lugar na terceira divisão do torneio ao derrotar o Peru por 3-1 durante a Copa Pan-Americana 2016, disputada na República Dominicana em julho – a Venezuela teria garantido a vaga como um dos três melhores sul-americanos na competição, além de Argentina e Colômbia. "Quando o sorteio dos grupos (do GP) foi realizado, nós vimos que a nossa equipe havia sido excluída do torneio", afirmou a presidente da FVV, Judith Rodriguez, numa correspondência dirigida à FIVB. A dirigente disse que vai brigar pelos direitos do time.

Seleção da Venezuela ganhou, mas não levou (foto: Norceca)

Curiosamente, quatro seleções passarão a integrar a terceira divisão (ou grupo 3, como chama a FIVB) do GP em 2017: Trinidad e Tobago (outra equipe que terminou abaixo da Venezuela na Copa Pan-Americana, porém entrou na cota da Norceca), Camarões, Azerbaijão e Hungria. Mas as venezuelanas não foram contempladas, apesar de ter sido divulgado em julho deste ano que haviam conquistado a vaga. A própria imprensa peruana, após a derrota de sua seleção, noticiou a classificação venezuelana ao GP. O Saída de Rede procurou a Federação Internacional, por meio da sua assessoria no Brasil, para que fosse explicada a ausência da Venezuela, mas não obteve resposta.

Sobre a autora

Carolina Canossa - Jornalista com experiência de dez anos na cobertura de esportes olímpicos, com destaque para o vôlei, incluindo torneios internacionais masculinos e femininos.

Sobre o blog

O Saída de Rede é um blog que apresenta reportagens e análises sobre o que acontece no vôlei, além de lembrar momentos históricos da modalidade. Nosso objetivo é debater o vôlei de maneira séria e qualificada, tendo em vista não só chamar a atenção dos fãs da modalidade, mas também de pessoas que não costumam acompanhar as partidas regularmente.

Blog Saída de Rede