Criticado, mas fundamental: entenda a importância de Maurício Borges para a seleção
Sidrônio Henrique
21/06/2017 06h00
Borges foi o melhor passador e o terceiro melhor defensor na fase classificatória da Liga Mundial (fotos: FIVB)
Elogiado por treinadores, mas criticado constantemente pela torcida, que não deixa de manifestar sua insatisfação com ele nas redes sociais, o ponteiro campeão olímpico Maurício Borges, 28 anos, 1,99m, vem demonstrando que é uma peça fundamental na seleção. O Saída de Rede conversou com o jogador, dois técnicos, um colega com quem divide a responsabilidade na linha de passe e um ex-atleta que foi referência na função, para mostrar que a equipe precisa dele.
"O Maurício Borges é um jogador muito importante para o nosso sistema defensivo e para a linha de passe. Um atleta que erra pouco e ajuda muito na construção e equilíbrio do jogo", disse o técnico da seleção masculina, Renan Dal Zotto, ao SdR. Ao lado do líbero, função hoje dividida entre Thales e Tiago Brendle, o ponta assume o peso de entregar a bola após o saque adversário na melhor condição possível ao levantador Bruno Rezende.
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Terminada a fase classificatória da Liga Mundial 2017, esse alagoano, que jogou as duas últimas temporadas na Turquia e na próxima voltará ao Brasil pelo Sesc RJ, liderou o ranking de recepção, com índice de 65,8% – resultado de uma ponderação entre passes excelentes, bolas colocadas em jogo e eventuais erros. Para chegar a esse percentual, o índice de passes A, aqueles irretocáveis, teve que ser superior a 70%.
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A marca impressiona na era dos saques que constantemente ultrapassam os 100 km/h, sem esquecer aqueles carregados de efeito ou ainda os chapados. Em determinados rodízios, é Maurício Borges quem fica mais exposto entre os passadores, muitas vezes recebendo em deslocamento. É bom que se diga que, no caso de um saque devastador, um passe B, aquele que não é ideal mas não exige grande deslocamento do levantador, é perfeitamente aceitável.
Borges recebe um saque durante partida da Liga Mundial, enquanto é observado por Lucarelli, Thales e Evandro
Carregador de piano
"O papel do Maurício Borges é fundamental, não só na seleção brasileira, mas em qualquer equipe. Ele representa o cara que passa nas seis posições. Agora, no novo ciclo da seleção brasileira, na ausência do Murilo, que tinha esse papel, do Nalbert anteriormente, ele tem essa função de servir ao time, servir ao levantador, para que as melhores opções ofensivas sejam possíveis. Na minha opinião, ele é um carregador de piano, que talvez não vá aparecer tanto em um primeiro momento, mas na verificação de como funciona o sistema ofensivo, se percebe o quanto ele é importante", explicou ao Saída de Rede o treinador Marcelo Fronckowiak, assistente técnico de Renan.
Não bastasse a excelência no passe, comprovada nos números e atestada por seus treinadores, Borges ainda se destaca na defesa. Foi o terceiro melhor defensor da fase classificatória da Liga Mundial. "Ele se posiciona muito bem, toca quase sempre na bola, é muito atento na cobertura", comentou Dal Zotto.
Foco no passe
Maurício Borges é também um bom sacador e bloqueador. O leitor talvez se pergunte: e o ataque? Com a palavra, um dos maiores ponteiros-passadores que o mundo já viu. "Posso falar disso de camarote porque era minha função, eu era um ponteiro-passador. Na seleção eu tinha esse papel de segurar o passe ao lado do líbero. Minha principal função era essa, o ataque era algo complementar. O Maurício tem um grande potencial de ataque, ele pode ser um jogador decisivo, mas a função número um dele é a recepção, é o volume de jogo", afirmou ao blog Nalbert Bitencourt, único atleta da modalidade a se sagrar campeão de todos os títulos possíveis entre seleções em qualquer categoria, do infantojuvenil ao adulto, peça-chave do timaço que foi ouro na Olimpíada de Atenas, em 2004.
Nas nove partidas até aqui da Liga Mundial 2017, Borges tem 41% de aproveitamento no ataque, não muito distante dos 47% de Lucarelli, o outro ponteiro titular, responsável por uma área menor no passe. O oposto Wallace, que fica livre somente para atacar, como ocorre com quem joga na saída de rede, teve 54% de aproveitamento nos três jogos que disputou.
Nalbert faz uma ressalva. "Acho que as pessoas pegam no pé dele porque é um jogador que realmente oscila em alguns momentos. Ele é capaz de jogadas maravilhosas e de erros bobos. Isso é uma coisa que ele tem que trabalhar, manter a concentração o jogo inteiro, pois tem todas as condições técnicas e físicas para ser um top de linha, um dos melhores ponteiros do mundo. Se ainda não atingiu esse nível, então ele precisa trabalhar a concentração".
O ponteiro entrando em quadra para enfrentar a seleção italiana na primeira semana da Liga Mundial 2017
Lidando com as críticas
O que será que o próprio Borges tem a dizer sobre as críticas que recebe? "Eu leio os comentários e procuro absorver as críticas boas. As ruins passam sem que eu dê muita importância. Acho que é a melhor maneira de lidar com isso, cada um tem a sua opinião", disse ao SdR.
Ciente da responsabilidade que carrega, o ponta fala com tranquilidade sobre seu novo papel. "Com a saída do Serginho da seleção, meu espaço aumentou no sentido de ajudar ainda mais na linha de passe, de dar um apoio maior aos jogadores mais novos, até mesmo o Lucarelli, com quem venho jogando há mais tempo".
O líbero Thales, em sua primeira temporada na seleção principal, destaca a importância do colega. "Para mim, o Maurício Borges é fundamental. É um jogador que eu conheço desde as categorias de base, quando jogamos juntos, e é um craque. Talvez não seja o cara que vá rodar as bolas mais difíceis, e para isso nós temos outros jogadores, mas para a linha de passe é essencial. Ajuda a mim e a qualquer líbero. Seja lá qual for o time, ele vai ser o passador", ressaltou ao Saída de Rede.
Destaque desde o juvenil
Quando ganhou o prêmio de melhor jogador do Mundial Juvenil 2009, Maurício Borges era uma das grandes promessas do voleibol brasileiro. Foi o último título do Brasil na categoria, derrotando Cuba na final, time que contava com jogadores do quilate dos ponteiros Yoandry Leal e Wilfredo León, ambos atuando também pela equipe adulta do seu país à época. Inúmeras contusões atrapalharam a carreira de Borges, inclusive duas cirurgias no pé esquerdo, mas ascender de coadjuvante a protagonista na seleção era questão de tempo.
De segundo líbero na conquista do último título brasileiro na Liga Mundial 2010, passando pela titularidade na campanha do ouro na secundária Copa dos Campeões 2013, um papel mais discreto no time que ficou com a prata no Mundial 2014, até ter destaque na Liga Mundial 2016 e na Olimpíada do Rio, Maurício Borges esteve na seleção a maior parte do tempo ao longo desta década. Às vezes no time B, como nas edições 2011 e 2015 dos Jogos Pan-Americanos, quando o Brasil ganhou o ouro e a prata, respectivamente.
Melhor momento
"Estou feliz de participar em mais um ano com a seleção brasileira, estou mais à vontade no início deste novo ciclo, tentando ajudar esses garotos que estão chegando agora. Considero que estou no melhor momento da minha carreira e tento colaborar da melhor maneira possível", contou o ponta.
Questionado sobre como se sente por estar entre os melhores do mundo no passe e na defesa, Maurício Borges mantém os pés no chão. "Treino todos os dias para estar nesta posição, mas muito mais para ajudar a equipe do que por qualquer outro motivo. Não fico olhando muito as estatísticas, não sou de ficar buscando essas informações, mas não podemos deixar de pensar que estar bem nesse quesito significa contribuir com o trabalho da seleção brasileira".
Colaborou Carolina Canossa
Sobre a autora
Carolina Canossa - Jornalista com experiência de dez anos na cobertura de esportes olímpicos, com destaque para o vôlei, incluindo torneios internacionais masculinos e femininos.
Sobre o blog
O Saída de Rede é um blog que apresenta reportagens e análises sobre o que acontece no vôlei, além de lembrar momentos históricos da modalidade. Nosso objetivo é debater o vôlei de maneira séria e qualificada, tendo em vista não só chamar a atenção dos fãs da modalidade, mas também de pessoas que não costumam acompanhar as partidas regularmente.